segunda-feira, 9 de abril de 2012

A ORAÇÃO DA IGREJA (Santa Teresa Benedita da Cruz, Carmelita)






























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"Por Cristocom Cristo e em Cristo, a vós, Deus Pai Todo-Poderoso, na unidade do Espírito Santo, toda a honra e toda a glória, agora e para sempre".
Com estas palavras solenes o sacerdote finaliza a oração eucarística cujo ponto central é o mistério da transubstanciação. Estas palavras expressam, de modo sintético, todo o sentido da oração da Igreja: honrar e glorificar ao Deus Trino, por Cristo, com Cristo e em Cristo. Embora aquelas palavras estejam dirigidas ao Pai elas são, ao mesmo tempo, glorificação do Filho e do Espírito Santo.


O que a oração exalta é a majestade transmitida, por toda a eternidade, do Pai ao Filho e deles ao Espírito Santo. Todo louvor a Deus se realiza por, com e em Cristo. Por ele porque somente por meio de Cristo a humanidade chega ao Pai e porque sua existência como Deus-homem e sua obra de salvação são a mais perfeita glorificação do Pai. Com Ele, porque toda oração verdadeira é um fruto da união com Cristo e, ao mesmo tempo, um aprofundamento desta união. Assim, todo louvor ao Filho é também um louvor ao Pai. Do mesmo modo, quando se louva ao Pai também o filho é louvado. Em Cristo, porque a Igreja em oração é o próprio Cristo - cada indivíduo que ora participa do seu Corpo Místico - e porque o Pai está no Filho. O Filho é o reflexo resplandecente do Pai, cuja glória manifesta. O duplo sentido de cada uma destas três expressões - "por ele", "com ele"e "nele- exprime, claramente, o papel de mediador do homem-Deus. A oração da Igreja é a oração do Cristo sempre vivo. Seu modelo original é a prece do Cristo durante sua vida humana.

1. A oração da Igreja como Liturgia e Eucaristia
Os evangelhos nos contam que Cristo rezou, como rezava um judeu devoto e fiel à Lei. Nos tempos prescritos ia a Jerusalém em peregrinação para participar - quando criança com seus pais e mais tarde com seus discípulos - das celebrações das grandes festas no Templo. Certamente ele cantou com santo fervor, junto com seu povo, os cânticos de regozijo que transbordavam a alegria antecipada dos peregrinos: "Que alegria, quando me disseram: Vamos à casa do Senhor!"(Sl.122,1).
Ele pronunciou as antigas orações de benções sobre o pão, o vinho e os frutos da terra, tal como são pronunciadas ainda hoje . Disto nós sabemos pela narração da ceia quando, pela última vez, ele reuniu seus discípulos para cumprirem um dos deveres religiosos mais sagrados: o cerimonial da ceia pascal, que celebrava o fim da escravidão no Egito. E é, talvez, precisamente esta última reunião que nos oferece o mais profundo vislumbre do interior da oração do Cristo e nos dá a chave para compreender a oração da Igreja. "Durante a ceia, Jesus pegou o pão, pronunciou a benção, o partiu e o deu a seus discípulos dizendo: "Tomai, comei: isto é meu corpo". Depois, pegando uma taça e dando graças, ele a deu a eles dizendo: "Bebei todos vós, pois este é meu sangue, o sangue da Aliança, derramado por todos para a remição dos pecados."1
Abençoar, repartir o pão e o vinho pertencem ao rito da ceia pascal. Mas, aqui, eles receberam um sentido inteiramente novo. Foi aqui o começo da vida da Igreja. É bem verdade que somente em Pentecostes ela surgirá como comunidade visível e cheia do Espírito. Mas aqui, nesta ceia pascal, se realizou o enxerto dos brotos sobre a vinha, enxerto que tornou possível a efusão do Espírito. As antigas fórmulas de benção, na boca de Cristo, se tornaram palavras criadoras de vida. Os frutos da terra se tornaram seu corpo e seu sangue, repletos de sua vida. A criação visível, no ceio da qual Ele já havia penetrado pela Encarnação está, agora, unida a Ele de um modo novo e misterioso. As substâncias que servem para sustentar a vida humano foram radicalmente transformadas e, aqueles que as consumir na fé, também serão transformados: passaram a participar da vida de Cristo, a Ele incorporados e, repletos de Sua vida divina. O poder do Verbo, criador de vida, está ligado ao sacrifício. O Verbo se tornou carne para libertar a vida que ele havia assumido; para oferecer a si mesmo e a criação redimida, por seu sacrifício,
em louvor ao Criador. Pela última ceia do Senhor, a ceia Pascal da Antiga Aliança converteu-se na Páscoa da Nova Aliança - no sacrifício da cruz sobre o Gólgota, em cada uma das ceias alegremente celebradas entre a Páscoa e a Ascensão, quando os discípulos reconheciam o Senhor nas frações do pão e no sacrifício da missa, pela Santa Comunhão.

Ao pegar a taça, o Senhor deu graças; nós podemos considerar que aquelas palavras de benção exprimiam, tão somente, um agradecimento ao Criador. Mas nós sabemos, também, que Cristo acostumava dar graças cada vez que, antes de realizar um milagre, elevava os olhos para seu Pai do céu . Ele dava graças porque sabia, antecipadamente, que seria atendido. Ele dava graças, também, pelo poder divino que trazia em si e pelo qual manifesta, aos olhos dos homens, a onipotência do Criador. Ele dava graças pela obra de Redenção que lhe foi dada realizar, obra que foi, em si, glorificação da trindade divina pela qual ele restaurou, para a sua pura beleza a imagem de Deus que fora desfigurada. Pode-se considerar também o contínuo sacrifício do Cristo sobre a cruz, na santa Missa e na eterna glória do céu como sendo uma só e grande ação de graças: a Eucaristia. Como ação de graças pela criação, redenção e consumação. Cristo ofereceu a si mesmo em nome de toda a criação, da qual é o modelo original, e na qual desceu para renovar interiormente e conduzi-la à perfeição. Mas ele chama, também, todo o mundo criado para, em união com Ele, dar as graças devidas ao Criador. Na Antiga Aliança, já havia uma certa compreensão deste caráter eucarístico da oração. A obra prodigiosa da Tenda da Aliança e, mais tarde, o Templo de Salomão, construídos segundo especificações divinas, foram consideradas como a imagem de toda criação, unida na adoração e no culto do seu Senhor.
A tenda em volta da qual o povo de Israel acampava durante sua peregrinação no deserto, chamava-se "A casa de Deus entre nós"(Ex. 38, 21). Ela foi concebida como a "morada aqui de baixo"em oposição à "morada lá do alto". Ela "representava mais que o universo criado", por isto o salmista canta :"Iahweh, eu amo a beleza de tua casa e o lugar onde a tua glória habita."(Sl 26, 8). Assim, como o céu - segundo a história da criação - foi estendido como um tapete, também foi prescrito que as paredes da tenda deveriam ser constituídas de tapetes. Assim como as águas do céu foram separadas das águas da terra, também uma cortina, no Templo, devia separar o lugar santo do lugar santíssimo(Cf. Ex.26,33). O mar de "bronze"foi construído tendo por modelo o mar contido por suas praias. Na tenda, o candelabro de sete braços, representava as luzes do céu. Os cordeiros e os pássaros representavam a multidão de seres vivos que povoam a água, a terra e o ar. Da mesma forma que a terra foi entregue aos cuidados dos homens, o santuário foi entregue aos cuidados do sumo-sacerdote, "que foi ungido para agir e servir na presença do Senhor". Quando concluiu a construção da morada, Moisés a abençoou, consagrou com os santos óleos e a santificou , tal como Senhor havia bendito e santificado, no sétimo dia, a obra de suas mãos (Dt. 30:19). Assim como o céu e a terra dão testemunho de Deus, também a tenda devia ser, na terra, o Seu testemunho.
Em lugar do Templo de Salomão, Cristo construiu um templo de pedras vivas: a comunhão dos santos. No centro deste templo ele se encontra como o Sumo e eterno Sacerdote; sobre o altar está, Ele mesmo, o eterno sacrifício ofertado. E toda a criação participa desta "liturgia", o solene serviço de adoração: os frutos da terra, reunidos em oferendas misteriosas , as flores e os candelabros, os tapetes e as cortinas do Templo, o sacerdote consagrado, como também, a unção e a benção da casa de Deus. Os Querubins não estão ausentes. Suas figuras visíveis, esculpidas pela mão do artista, foram postos como vigias ao lado do Santo dos Santos. E, como cópias vivas deles, os monges, "semelhantes aos anjos", rodeiam altar do sacrifício e asseguram que o louvor a Deus, jamais cesse, tanto na terra como no céu. Eles são a boca da Igreja que canta, suas orações solenes emolduram o Santo Sacrifício. Elas também impregnam, emolduram e santificam todas as outras tarefas do dia, de tal forma que a oração e o trabalho tornam-se uma única opus Dei, uma única liturgia.
Suas leituras da Santa Escritura e dos Santos Padres da Igreja, do santoral da Igreja e dos ensinamentos de seus pastores são um grande, contínuo e crescente hino de louvor à ação da Providência e à realização progressiva do plano eterno da salvação. Seus cantos matinais de louvor convidam toda a criação a se unir no louvor ao Senhor: montanhas e colinas, rios e riachos, mares e terras e todos aqueles que neles habitam; nuvens e ventos, chuva e neve, todos os povos da terra, todos os homens - de todas condições e de todas as raças - e também, todos os habitantes do céu, anjos e santos. Os anjos participam da grande Eucaristia da criação, não somente por meio de suas representações feitas pela mão do homem ou de suas imagens humanas, mas em pessoa.2 Nós todos devemos nos unir, em nossa liturgia, aos seus eternos louvores a Deus.
"Nós", aqui, não se refere somente aos religiosos que foram chamados para os louvores solene a Deus, mas a todo o povo cristão. Quando o povo cristão vêm, nos dias santos, às catedrais e igrejas, quando eles participam ativa e jubilosamente nos corais e nas formas renovadas da vida litúrgica, este povo cristão está testemunhando que está consciente de sua vocação para louvar o Senhor.
A unidade litúrgica da Igreja do céu e da Igreja da terra, que dá sua ação de graça "por Cristo", encontra sua mais forte expressão no Prefácio e no Sanctus da Santa Missa. Entretanto, a liturgia não deixa subsistir qualquer dúvida sobre o fato de que nós não somos, ainda, cidadãos plenos da Jerusalém celeste, mas somente peregrinos a caminho da nossa pátria eterna. Nós temos de nos preparar antes de poder ousar elevar os olhos para as alturas radiantes e unir nossas vozes ao «Santo, Santo, Santo...» do coro celestial. Toda coisa criada, para ser empregada no ofício divino, deve ser retirada de seu uso profano; deve ser purificada e consagrada. Antes de subir ao altar o sacerdote deve purificar-se, confessando suas faltas e, os fiéis como ele, devem fazer o mesmo. A cada nova etapa da Missa, ele deve renovar a oração pela remissão de seus pecados, daqueles que estão à sua volta e por todos aqueles que devem receber em abundância os frutos do sacrifício. O sacrifício é sacrifício de expiação, que transforma os fiéis, assim como as oferendas,abrindo o céu para eles, tornando-os capazes de dar graças de um modo que seja agradável a Deus. Tudo aquilo de que necessitamos para sermos acolhidos na comunhão dos santos está resumido nos sete pedidos do Pai Nosso que o Senhor rezou, não em se próprio nome,
mas para nos ensinar. Nós o dizemos antes da comunhão e, se o fizermos sinceramente e de todo nosso coração e recebermos a santa comunhão com a disposição de um espíritoapropriado, Ela nos trará a realização de todos nossos pedidos. A comunhão nos livrado mal porque nos purifica de todos os pecados e nos dá a paz do coração que afastao aguilhão de todos outros "males". Ela nos dá o perdão dos pecados cometidos e nosfortalece contra as tentações. Ela é, em si mesma, o Pão da Vida de que necessitamostodos dos os dias, para lançarmos raízes e crescer até nossa entrada na vida eterna. Ela fazde nossa vontade um instrumento dócil à vontade divina. Além disso, ela põe as fundaçõesdo Reino de Deus em nós dando-nos lábios limpos e coração puro para glorificarmos o Santo Nome de Deus.
De novo, portanto, se manifesta como o ofertório, a comunhão e o louvor divino são intrinsecamente unidos. A participação no sacrifício e na ceia sagrada transforma a alma em uma pedra viva da Cidade de Deus e, verdadeiramente, cada uma em templo de Deus

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